março 23, 2024 5:41 PM

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A única coisa que conseguia sentir era o frio, tão intenso quanto minha teimosia em tentar forçar a chave na porta. Virei uma, duas, três… até que a chave escapou e feriu minha mão.  É a minha cara fazer isso com uma chave e uma porta, mas com a minha vida não.

Na vida de jornalista, cada hora é um flash. Toda noite chego esbaforida, agitada e falando até com as paredes. Aquela noite havia sido diferente. Ao entrar em casa, meus pensamentos voltaram para a pauta dos minutos anteriores: salvar vidas. Por uma hora ouvi atentamente dois médicos e um oficial do Corpo de Bombeiros contarem histórias e ocuparem o dial de uma emissora de rádio com lembranças do dia-a-dia de heróis.

Fiquei num canto do estúdio da rádio que serviu de palco para o bate-papo. Ali, meus pensamentos ora se escondiam para dar uma espiada em outro tempo e espaço. Entre os participantes da entrevista havia um médico intensivista. Fixei os olhos na minha imaginação quando ouvi o relato do profissional a respeito das famílias dos idosos internados em UTI.

“_Faça o que for preciso para mantê-lo vivo é o pedido que mais recebo na UTI”, relatou o médico. Durante a explicação das inúmeras situações, ele disse que é uma via de mão dupla. O paciente também precisa apresentar um quadro clínico favorável que o mantenha vivo. As máquinas não trabalham por si só. O tratamento, então, torna-se paliativo.

Permaneci na imaginação, porque as palavras do médico me transportaram a outras situações semelhantes que cometemos na vida. Quantas vezes insistimos em amizades, situações, pessoas, amores que não vão sobreviver por muito tempo? Lembrei da dificuldade e do ferimento que provoquei em minha mão por tentar abrir a porta com a chave errada. O universo dá sinais. E naquela noite eu tive dois deles, que aguçaram minha reflexão. O que fazer? Adotar o paliativo e empurrar até que o destino ou os demais envolvidos resolvam? Desistir? Insistir, assumir os riscos e seguir? É importante pesar todos os lados.

Em 2003, trabalhei em uma emissora de rádio em São Paulo por oito meses. Foram os piores da minha vida. Não era feliz. Vivia mal humorada, cabisbaixa e irritada. A demissão foi a melhor coisa que aconteceu em minha vida. Encontrava as pessoas na rua e ouvia elogios. Muitos perguntavam “O que você fez que está mais bonita?” Só havia me livrado de uma situação que não me trazia felicidade. Adotei o paliativo e joguei a responsabilidade para a vida. Tive sorte, porque ela resolveu. Só que nem sempre é assim…

A desistência é difícil, mas não deve ser encarada como fracasso. Dependendo de como for encarada, é superação. Significa que o investimento emocional para manter a ligação entre você e uma determinada situação é pesado demais e, para o bem-estar, é necessário morrer ali e renascer para outra história, uma nova oportunidade de planejar o melhor.

Se você não quiser abrir mão, busque a serenidade e a sabedoria. Olhe para dentro. Converse com o seu coração… Só vocês dois. Afaste-se temporariamente da situação para encontrar o caminho e traçar a melhor rota. Tente encontrar o meio termo… insistir um pouco menos, desistindo um pouco mais.

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Paty PasquiniPatrícia Pasquini, jornalista, radialista, blogueira, palmeirense, aquariana, apimentada, filha, irmã, tia, prima. Escreve quinzenalmente, às quintas, para o Portal Vila Nova Conceição SP.

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